Thursday, January 15, 2009

APOSENTANDO O ESPAÇO PÚBLICO

O Diários do Rum mudou. Agora eu estou aqui.

Monday, November 24, 2008

Quem visita esse blog sabe que eu não costumo usar muito ele para fins confessionais – é meio chato. Mas... essa rapaziada merece.

Troços & destroços

E no princípio era o verbo.

Tudo começa no verbo, porque às vezes a ação é a única maneira. E é ao redor de uma mesa que, desde sempre, a humanidade costuma verbalizar. Um dia, há tempos, eu e mais dois caras nos pegamos ao redor de uma mesa de bar, drenando conhaques pra combater o frio, falando besteiras – mulher, é claro; conversa de homem em bar sempre termina em mulher. A bebedeira deu certo, foi repetida, viramos bons colegas. Eu era então um roceiro, um caipira recém-chegado à “cidade grande” - e continuo sendo. Aqueles dois caras eram as primeiras duas pessoas importantes que eu conhecia por estas bandas... mas só ia descobrir isso algum tempo depois. Viraram figuras de primeira relevância na minha então novíssima rede social. Um dia, decidi que já era hora de chamá-los de amigos mesmo. Os amigos são uma parte do meu catálogo social onde eu incluo pessoas com muito cuidado; pinçadas mesmo. Diferencio muito amizade de coleguismo.

Então, um dos sujeitos resolveu engatar um namoro, sob os veementes protestos dos outros dois. Saldo: tivemos que admitir uma “mina” no meio de nossas conversas de macho, o que incluía a instauração de um novo código de conduta – nada mais de falar de mulheres e aventuras sexuais. Norma baixada, fui o primeiro a fazer questão de desrespeitá-la, na tentativa de afugentar a fêmea. Não funcionou. Tentamos resistir, tentamos fazer bares paralelos, só de homens; mas acho que o amor foi mais forte. Enfim, precisamos nos consolar com o fato de que a Fer estava em meio ao grupo.

Bem, precisávamos então de mais uma mulher, pra fazer companhia a ela, já que uma moça poderia ficar muito constrangida em meio a tanta testosterona. Foi a vez de angariar a Mari, que dos males foi o menor: ela é mais macho que muito homem que eu conheço.

João (o Bolo), Pedro (o Pedrada), Fer e Mari: essas quatro criaturas foram meu porto nesses quatro anos de cidade grande; sem elas eu talvez não tivesse encontrado um lugar razoavelmente seguro para ancorar minhas pernas. Eles me agüentaram. Eu, o especialista em roubadas, um sujeito que exige muito de seus amigos (sobretudo, muita paciência, tenho consciência disso). Multiplicaram-se as bebedeiras, umas brigas, uns acertos de contas... o Bolo emagreceu um bocado – e também sumiu uma época. Hoje, é um homem responsável, de relacionamento estável, quase advogado, de cabelos curtos e sapatos sei lá de que marca (eu não fico prestando atenção nessas frescuras)... veja só, quase um homenzinho! É interessante olhar em retrospecto e ver como todos tivemos nossas mudanças. (Meu Deus!, o Pedro era um surfista!) Não gosto da palavra “amadurecer”, mas creio que todos nos tornamos pessoas um pouco melhores. E, entre mortos e feridos, sempre sobrevivemos.

Conhecemos outros bróders, é claro, mas como diz a Fer, sempre formamos o time do boteco old school. E do time onde esses quatro jogam, só outras duas pessoas fazem parte atualmente.

Como diz a música do Belchior, eu sou só um rapaz latino-americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes, e vindo do interior... ou seja: não tenho lhufas, xongas... assim, ofertei a eles a única coisa que tinha e que considerava de valor: lealdade. Espero que, por ventura, não tenha parecido pouco.

Na sexta-feira, tiramos uma foto, pra guardar de lembrança, durante um momento meio “emo”, todo mundo entorpecido de vinho – o álcool, essa coisa que faz aflorar tanto a fúria quanto o sentimentalismo. Nesse momento, perto do fim da faculdade para pelo menos três de nós, os elos vão afrouxando-se, e já começa a dar saudade.

Tenho dois amigos mortos, o que, creio, já é um bom saldo para alguém com 21 anos. Acabei deixando alguns outros para trás, arremessados que vivemos sendo pelo mundo para os lugares mais insólitos. Paciência. A vida nunca foi mesmo reconhecida por seu senso de Justiça. Devo confessar, porém, que invejo os tigres, esses animais solitários que não estabelecem vínculos com nada e vivem (creio eu, nunca fui tigre pra saber exatamente) bem assim.

De qualquer forma, o que quer que aconteça, por favor, cuidem-se, crianças.

Thursday, November 20, 2008

Abaixo, algo que rabisquei dia desses. Tudo meio parado por aqui, mas às quintas sigo firme n'O Diazepam - se sentir saudades, cola lá.


Resmungos

Tânia ligou-me ontem, furiosa. Eu estava com uma ressaca brutal e não pretendia levantar da cama – mas nem fodendo. Mas o telefone explodia, insistentemente (trrrriiiimmm!!!). São os sortilégios da tecnologia. Por fim, levantei-me, cambaleante; meu centro de gravidade, àquela altura, devia estar parecendo um saca-rolhas.

A voz de Tânia era viva e pungente, embora ela estivesse muito longe, interior adentro. Fiquei imaginando suas cordas vocais vibrando, a energia mecânica transformada em fonemas, e então em pulsos elétricos que viajavam centenas de quilômetros de fiação telefônica; por fim, a voz dela, irritante, em meus ouvidos.

Quando Tânia me trocou, eu fiquei abatido; não por ela – hoje sei -, mas pela estabilidade que eu deixava escapar. Porém agora posso dizer que estabilidade é uma coisa com a qual devem se preocupar engenheiros de carros de corrida. Não eu. (É que eu sou de agosto, meu bem, mês do cachorro-louco.) Eu sou mais como um Cadillac viajando numa noite de chuva a 150 quilômetros por hora em uma estrada sinuosa – e com a barra de direção quebrada. Eu eu tenho os ombros retesados, sempre tencionados, como se a todo momento estivesse à espera de uma pancada. Herdei esses ombros de meu pai; está inscrito em meus ossos, consta em meus nervos, percorre meu sangue. Então, esqueci Tânia – afinal de contas, o meu pinto não caiu, caiu? - e esperava que ela me dispensasse a mesma consideração. Agora, o passado me volta via empresas de telefonia. O requinte de crueldade: ela me ligou a cobrar.

Detesto telefones. É um trauma.

Nunca lidei muito bem com mulheres. Fitzgerald disse que a deslealdade nunca poderá ser uma característica totalmente censurável em uma mulher. Justiça seja feita, mas jamais aprendi a lidar com isso. E já que o amor é uma questão de escolha... não é, Bóris? Bem, você não entende nada de amor. Mas sim, eu lhe digo, é uma questão de escolha. Uma escolha que se faz dentro do acaso. Pois então eu escolho mandar Tânia ao inferno, como uma cadela de três cabeças a guardar a porta do recinto.

Murilo, seu filho da puta, eu estou falando com você!

Essa era Tânia, ontem. Acho que irritei-a um pouco com meu silêncio.

Onde deixei meus cigarros?

Bem, terminou como sempre termina, o que não é exatamente um fim; algo que vive a terminar aniquila todo e qualquer sentido que o fim possa ter. De qualquer forma, ela desligou o telefone, fora de si, e eu fui fazer café, uma tentativa de pescar a mim mesmo na sarjeta.

Bóris?

O cachorro abanou o rabo e ergueu-se sobre as quatro patas, a língua dependurada na boca. Murilo fez um gesto de censura a si mesmo, proibindo-se terminantemente de voltar a conversar determinados assuntos com o cão.

Wednesday, November 05, 2008

O legado de minhas misérias

Meus olhos vão ficando gastos. Hoje mesmo, resolvendo uma pendenga com Jorge Amado, de repente as letrinhas se embaralharam, afoitas, e quase que entram em luta corporal e confundem todo o bom parágrafo do bom baiano. Humano que sou – demasiado humano –, culpei as letrinhas, porque humano que é humano sempre precisa arrumar algo – ou alguém – em quem pôr a culpa; está inscrito no DNA. No fundo sei, porém, que a culpa é minha. Semana passada mesmo andava com dor nas costas. É a idade. A velhice bate à minha porta, caquética, de bengala, cabelos ralos e brancos. Aguardo para breve o enrugamento da pele e a incontinência urinária. Vinte e um anos, tão novo!, dirá a meia dúzia de gatos pingados que comparecer ao meu funeral quando, enfim, quando eu bater as botas, ir para as cucuias, vestir o paletó de madeira, pedir o boné. Talvez mamãe chore. Tão novo!

Não tenho medo, mas encasqueta-me uma coisa. Que saldo deixo nesta vida? Diz-me a sabedoria popular – que nem sempre é sábia e geralmente está a dizer besteiras – que um homem deve plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho.

Vejamos.

Árvore eu plantei. Devia ter sete ou oito anos, creio, na escola, por ocasião de algum dia da árvore. Verdade seja feita, quem fez o trabalho pesado foi o zelador, o seu Arlindo, homem de poucas palavras e poucos sorrisos – para mim, ao menos, que vivia a infernizar-lhe a vida. Tudo que fiz foi atirar a mudinha de fícus na cova já feita, cobrir-lhe de terra e regar-lhe. Tenho provas, caso algum dia a sabedoria popular venha querer tirar satisfações. Está tudo registrado numa fotografia, uma indefectível prova de como sou feio e desajeitado diante do mundo. Estou lá, de calças curtas, o cabelo então muito loiro e liso a cair-me nos olhos, esforçando-me a segurar com as duas mãos um regador na altura adequada. Bem verdade que a pobre da árvore não viveu para contar a história. Tivemos a infeliz idéia de planta-la justo no lugar do pátio que usávamos para jogar futebol e brincar de pegador, no recreio. A sabedoria popular, porém, na diz a respeito da árvore precisar crescer forte e frondosa. Plantar, eu plantei. Tarefa feita.

Livro eu não escrevi. Ainda. Mas quem sabe um dia brinde o mundo com duzentas a trezentas páginas das besteiras que eu digo e penso – quase sempre faço também. Quem sabe ganhe algum prêmio da Academia de Letras do Centro Cívico, se até lá alguém se der ao trabalho de funda-la. Serei cumprimentado por vizinhos, talvez. É possível. Acho que será uma história de amor, que precisamos reservar um espaço para o amor nesta vida, e como o amor só fica bonito nos livros (amor, coisa para amadores), sapecarei ele lá mesmo. Sim, o amor fica bonito nos livros. Vide O amor nos tempos do cólera, O grande Gatsby, O sorriso do lagarto. A insustentável leveza do ser, não. Desse eu não gosto.

Já escrevi um conto de amor. Quer dizer, mais ou menos de amor. Era meio de ódio também. Não tinha aprendido ainda que a raiva não escreve. Aliás, não sei se aprendi até hoje. Quatro páginas das quais arrependo-me. Envergonho-me até. Fiz besteira. Não devia ter feito. Já me livrei dele. Pena ter inscrito ele num concurso. Espero que percam ele por lá, dêem sumiço no troço. Espero também a consideração dos dois ou três leitores, no que tange meu futuro livro. Favor, não me ler no banheiro. Tenho horror à idéia das pessoas lendo-me no banheiro. O sujeito lá, fazendo o que se faz no banheiro (não me peçam para escrever aqui, por favor, respeitem as senhoras), e me lendo. Merda!

Perdão, senhoras. Escapou-me.

Fato é que esse projeto é para depois. De qualquer forma, tenho um blog. Dois, na verdade. Um com os coleguinhas de jornalismo e outro só meu, que preciso de um espaço privado onde possa mandar e desmandar sem ser importunado. Gosto de mandar e desmandar. Sou um sujeito mandão. Será que blog vale? A sabedoria popular também nada diz a respeito de blogs. Dúvida. Receio. Ah, deve valer.

Já filho, isso eu nunca fiz. Acho. Homem nunca tem muita certeza dessas coisas.

Thursday, October 16, 2008

De volta à forma

Quinta-feira é meu dia. Clicaí.

Saturday, October 11, 2008

Pequena crônica sobre o silêncio

Minha família e eu moramos num apartamento minúsculo no centro de Curitiba. São quatro pessoas, de modo que se alguma coisa mais entrar em casa provavelmente seremos obrigados a atirar algo pela janela, a fim de fazer espaço. Num lugar assim, é impossível ficar sozinho, em silêncio. O barulho é perene. A tevê está quase sempre ligada em alto volume, porque meu pai, creio, é um pouco surdo; a máquina de lavar roupas vive um eterno vai-e-vem, num zumbido de trovão; meu irmão é um tagarela que tem verdadeiro temor à possibilidade de não ser ouvido e por isso expressa-se sempre aos berros. Os vizinhos, não sem razão, devem achar que somos malucos; além de tudo, somos uma família dada a rompantes de fúria e de ternura.

Sempre foi assim. Lembro de quando morávamos com minha avó materna, no interior, numa grande casa de madeira que há muito pedia reparos em caráter de urgência. Nas festas de fim de ano, a família se reunia, os filhos vindos de longe – família grande, sete ao todo -, as noras, os filhos dos filhos, os adjuntos; às vezes aquela velha casa ficava uma semana inteira com mais de trinta pessoas sob o teto, uma algazarra, uma balbúrdia, um pandemônio, gente dormindo pelo chão, conversas paralelas que compunham uma massa sonora impenetrável, crianças aos gritos, a gargalhada afetada e em volume máximo de meu avó, um dente de outo a resplandecer. Havia ainda um papagaio, que minha avó garantia ser poliglota mas que na verdade não fazia mais do que gritar papagaíces o dia todo. Se casas pudessem enlouquecer, posso garantir que aquela lá o teria feito.

Acostumei-me assim ao espalhafato, a conviver com um ar de textura tão encrespada quanto a do mar em tempestade; acostumei-me a viver em ambientes de um sossego de guerra, algo como se um conflito marcial tivesse estourado há pouco, agorinha mesmo, não faz nem dois minutos; habituei-me ao barulho constante; habituei-me a fazer tudo com barulho, e posso ler e escrever tranqüilamente em meio a um saloon de bêbados e dança, como aqueles ferozes bares que vemos nos westerns. Acima disso, incomoda-me o silêncio; em meio a ele uma simples torneira pingando é capaz de me levar à loucura.

Acho que descobri por quê.

Escrevi há poucos dias, num texto, que o silêncio, uma substância inextricável, é a sustança da solidão. Uma amiga me chamou a atenção para o trecho. Fiquei com isso na cabeça. Conclui que jamais escrevi algo mais correto.

deus (ou do ateísmo)

não rezo. há tempos. não agradeço a deus pelo copo no bar, pelo álcool balsâmico a viajar pelos músculos e aquietar finalmente a mente; não agradeço a deus pelo pão ou pela carne; nem pelo cheiro de terra depois da chuva, pelos dois ou três amigos realmente leais que fiz, pelo cigarro depois do café puro; não agradeço por graciliano, por quintana, por leone ou por belchior; não louvo a ele pela comida no prato ou pelo sorriso de meu irmão; não agradeço o dia vindouro, o fato de estar vivo ou o canto do sabiá que de vez em quando dá pra piar em minha janela; nem pela rosa, nem pelo cravo, nem pelo doce da ebriedade nas noites sabáticas; nem sequer lembro de deus durante o futebol, durante os beijos ou durante as transas; não agradeço a deus por estar onde estou ou por ter me tornado o que me tornei.

mas sou justo, e se não lhe sou grato, também não o culpo.

não culpo a deus pelas crianças famélicas, pelos dias aziagos, pelos ouvidos de mercador do mundo; aliás, não culpo a deus por o mundo estar nas mãos de meia dúzia de poderosos; não culpo a deus pelos rins perenemente doloridos, pela saúde frágil, pelos braços magros e sem forças; nem ao menos pela promessa de futuro doloroso; não culpo a deus pelo temperamento ruim, pelos vícios que ultrapassam em muito as virtudes, pela solidão; não o culpo por hitler, por bush ou pelas cruzadas ou pela inquisição; não o culpo pela fome, pela peste, pela guerra e pela morte; nem por ratiznger e seus delírios, nem por pio xii, nem por hiroshima; nem ao menos o culpo pelos amigos que morreram, jovens, de infarto fulminante e bebedeira ao volante – um pé pesado no acelerador, uma reta que de repente decidiu virar à esquerda; não culpo a deus pelo nó na garganta dos humilhados que querem chorar mas não conseguem, nem pelo coração acossado dos mal-amados; nem pelo lixo de muitos, nem pelo luxo de poucos; nem pelos sofrimentos de jó, nem pela perversidade gratuita, pela violência sem motivo, pelo mal que galopa livre em um cavalo alado; nem pelo hediondo, nem pelo bruto, nem por nada; não culpo a deus pelos olhos marejados, pela melancolia destes tempos tristes, pelo câncer a roer corpos já minguados; não culpo a deus pelo que me tornei.

não culpo porque não o creio. deus não tem nada a ver com isso. quero crer, sim, em homens bons – aviso quando encontrar um.

Thursday, October 09, 2008

A internet em mãos erradas, hoje é meu dia n'O Diazepam. Vide bula e clicaí.